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Portal Brasileiro do Turismo

Opinião

O capital estrangeiro

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No Brasil; o limite ao capital estrangeiro nas empresas aéreas é de 20%; conforme a redação dada pelo inciso II do Art. 181 do Código Brasileiro de Aeronáutica. De forma complementar; a direção deve ser confiada a brasileiros; tal como dispõe o inciso III deste mesmo artigo. Se tudo correr bem; o Congresso Nacional deve aumentar este limite para 49% e alterar o CBA em outros pontos igualmente ultrapassados. Aliás; se fôssemos um país onde os governos realmente tivessem a aviação civil como um setor de destaque nas suas agendas sociais; políticas e econômicas; a Emenda 6 já teria sido aplicada sobre o Código Brasileiro de Aeronáutica há 15 anos.

Contudo; como prova cabal de que a aviação civil não integra o rol dos setores mais importantes para o país; além dos acontecimentos trágicos de 2006 e 2007 e de algumas ações inconsistentes tomadas desde então; estamos aqui escrevendo sobre um assunto que já deveria ter sido modernizado há muito tempo. Entre os principais itens a serem diretamente influenciados caso haja uma substancial abertura para o capital estrangeiro destacamos: a concorrência no mercado doméstico; a capacidade de geração de empregos no setor e a segurança das/nas operações aéreas.

Concorrência no mercado doméstico: As barreiras econômicas e; mais adiante; as barreiras de sobrevivência; constituem grandes limitações à entrada de um maior número de empresas no setor. Mais ainda; os lucros auferidos pela atividade são; normalmente; reduzidos se considerado o volume de capital investido e as receitas brutas. Como se não bastasse; a indústria também se caracteriza por demandas sazonais e um comportamento cíclico que muito depende do comportamento da economia nacional e da internacional. Neste prisma; o número de grandes empresas tanto no Brasil como na maioria dos países é; historicamente; reduzido.

Assim; de uma forma simplista; pode-se concluir que; pelo conjunto das suas características principais; a indústria do transporte aéreo possui uma tendência quase que natural à concentração (vide a onda de fusões e aquisições nos últimos cinco anos; em todo o mundo!). Se os atuais 20% fossem para os 49% anunciados e este aumento fosse acompanhado por uma maior participação de estrangeiros na direção da empresa (incluindo a presidência!); algumas empresas existentes poderiam ser alvos diretos de interesse por parte de empresas aéreas de grande rentabilidade – caso da Ryanair irlandesa e da alemã Lufthansa; por exemplo – e também mega-investidores em aviação; tais como Sir Richard Branson e os grupos Macquarie e TPG (este já está na Azul). Assim; haveria oportunidade de se aumentar a concorrência principalmente se o capital e os modelos de gestão estrangeiros fizessem com que as nossas empresas se tornassem mais competitivas; mais eficientes.

Além disso; algumas das novas empresas a serem constituídas no Brasil poderiam explorar nichos de mercado “abandonados” ou sub-utilizados pelas empresas brasileiras. De uma certa forma; é o que a Azul e a Trip têm feito com Campinas e outras localidades que estavam; digamos; “esquecidas” pelas outras empresas. Outro caso interessante seria o de as novas empresas atuarem especificamente no mercado regional e passarem a competir diretamente com as regionais atuais como alimentadoras e distribuidoras dos voos domésticos e internacionais troncais.

Impactos na capacidade de geração de empregos: Aqui reside uma parcela do verdadeiro “interesse nacional”. Ao contrário do que pensam muitos contrários ao aumento de capital estrangeiro; o “interesse nacional” não passa unicamente pela observação dos interesses dos sindicatos dos aeroviários ou dos aeronautas. Se fosse corretamente colocado à mesa de negociações; o verdadeiro “interesse nacional” estaria expresso na forma da geração de empregos; no crescimento da economia nacional; no crescimento e desenvolvimento do turismo nas diversas regiões do país; no crescimento e desenvolvimento das diversas indústrias que sustentam o turismo; na geração de negócios e no incremento das exportações.

Desta forma; se considerado apenas o turismo e a maior geração de negócios e crescimento das exportações; cada um seria muito mais gerador de empregos e muito mais gerador de oportunidades para a economia nacional do que o conjunto de interesses defendido pelos sindicatos. Outro item a ser levantado seria a possibilidade de redução nos quadros das empresas por ocasião da entrada de uma nova estrutura mais eficiente. Por mais que fosse negativo para aqueles que por ventura sejam dispensados; empresas aéreas mais eficientes e produtivas são mais seguras e tendem a oferecer preços mais próximos aos que os vários segmentos da sociedade seriam capazes de pagar. E isso; com toda certeza; é muito positivo para o cidadão brasileiro e para a economia brasileira.

Por fim; os pilotos; co-pilotos; comissários e mecânicos dispensados pela Varig; Vasp e Transbrasil; acabaram absorvidos pela Tam; Gol; Webjet; Avianca; Trip e pela novata Azul. Outros estão em empresas na Malásia; China; Irlanda e outros países. Isso vem demonstrar que não é apenas o ingresso de capital estrangeiro que pode trazer demissões em larga escala; bem como vem demonstrar que há alternativas para milhares de recolocações tanto no mercado doméstico como no internacional.

Impactos na segurança das/nas operações aéreas: O impacto na segurança das operações seria; a princípio; nenhum. Qualquer profissional atuante no setor que levantasse suspeitas quanto a uma redução na segurança das operações; na forma de manutenções preventivas e corretivas não realizadas; reposição de peças oriundas do mercado paralelo e na forma da falta de qualificação técnica de tripulantes; estaria levantando suspeitas diretamente quanto à capacidade técnica e profissional da Agência Nacional de Aviação Civil em; correta e eficientemente; fiscalizar os quesitos de segurança.

Em qualquer cenário; é importante destacar que independentemente de uma entrada maciça de capital estrangeiro no setor; nenhuma das atuais empresas aéreas brasileiras teria garantida a sua existência no futuro. A complexidade e dinâmica dos mercados e da própria atividade são enormes e; simplesmente; não há como garantir o sucesso ou a sobrevivência – no médio ou longo prazo – de qualquer empresa aérea que seja; nem no Brasil; nem em qualquer outro país.

Respicio A. Espirito Santo Jr. é professor adjunto de Transporte Aéreo da UFRJ e presidente do Instituto Brasileiro de Estudos Estratégicos e de Políticas Públicas em Transporte Aéreo (Cepta)

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