
Carlos Prado, presidente do Conselho de Administração da Abracorp
Ajustes, governança e confiança. Estes são três dos pontos que fazem Carlos Prado, presidente do Conselho de Administração da Abracorp, acreditar que as empresas do setor – em especial as TMCs irão passar por esta crise. “A grande maioria fará a travessia, chegará com feridas, mas sairá do outro lado viva”, disse o dirigente em entrevista exclusiva ao M&E. Ele acredita que até o momento as medidas de ajuda anunciadas pelo governo são razoáveis e atendem em parte o setor, mas que o maior gargalo no momento é o acesso ao crédito. Sobre uma retomada, Prado aposta em uma volta gradual a partir de junho e que o movimento no segundo semestre seja metade do que foi em 2019. A entidade divulgou nesta segunda-feira (04) os deus dados do primeiro trimestre, que acusaram uma queda de 18,7%.
MERCADO & EVENTOS – Como o corporativo, empresas TMCs e demais players, estão lidando com a crise gerada pela pandemia?
Carlos Prado – Basicamente quase todas as agências Abracorp fizeram os ajustes necessários para este primeiro momento. Tivemos desligamentos, reduções de salários de 25, 50 ou até 70% em algumas. Além disso, o pessoal está todo trabalhando em casa. E, mesmo reajustando a jornada, não há demanda, uma vez que as viagens foram praticamente a zero. Então muitos estão aproveitando este tempo para qualificação e cursos e reciclagem. A demanda por viagens foi a algo muito próximo a zero
M&E – Há alguma iniciativa para apoiar os clientes neste momento?
Carlos Prado – Temos muita gente trabalhando em home office, muitos escritórios fechados ou trabalhando com o mínimo necessário. No entanto, as áreas comerciais estão trabalhando, mesmo que part time para justamente continuar se relacionando com clientes. O que a Abracorp recomenda que as agências continuem em contato com fornecedores e com clientes. É o mínimo que a gente pode fazer neste momento desafiador.
M&E – Você acredita, especialmente para o corporativo, que a situação atual pode causar uma mudança de hábitos dos viajantes e das empresas?
Carlos Prado – Acredito que teremos mudanças nas políticas e hábitos de viagens. Em relação aos eventos, certamente haverá uma busca por tecnologia. Quando vemos eventos e encontros pequenos, a tecnologia poderá, de fato, suportar isso. Mas quando falando de eventos grandes, passando este momento de isolamento e distanciamento social, temos algo que a tecnologia não pode fazer. O propósito de um evento é o olho no olho, a busca do conteúdo, inserir pessoas em novas culturas e proporcionar uma nova experiência aos participantes. Isso só é possível com as pessoas presentes. Os eventos vão continuar, mas não neste momento.
O propósito de um evento é o olho no olho, a busca do conteúdo, inserir pessoas em novas culturas e proporcionar uma nova experiência aos participantes. Isso só é possível com as pessoas presentes. Os eventos vão continuar, mas não neste momento.
M&E – E em relação as viagens?
Carlos Prado – No corporativo, algumas viagens para relacionamento talvez sejam compensadas com o uso da tecnologia. Mas o brasileiro, e o latino em geral, é muito relacional. Então, acredito que não teremos mudanças, mas teremos ajustes. Nos próximos dias finalizaremos uma pesquisa sobre este tema com os clientes. Teremos uma redução ou troca pela tecnologia, mas não será enorme. O ajuste será algo em torno de 10 ou 15%. Pois as empresas estão apostando muito na questão do relacionamento. Temos que lembrar que haverá um novo comportamento por parte das pessoas. Há ainda a questão do home office, que será uma tendência não apenas das agências de viagens, mas de todas as empresas. Aqui na Abracorp. As empresas já estavam na nuvem. Este teletrabalho é uma tendência. A Gol, por exemplo, já tinha isso antes da crise. A meu ver, isso é fantástico, pois diminui a emissão de CO2, ar das cidades ficará melhor. O funcionário não ficará mais tão estressado por conta dos percursos e alguns custos das empresas irão diminuir. São novos tempos e isso veio para ficar. Vamos amadurecer. O nosso colaborador terá mais autonomia, estamos caminhando no sentido de construir este caminho, não só no turismo.
M&E – As empresas já estão alterando as suas políticas de viagens?
Carlos Prado – Não chegaram ainda em mudanças específicas, mas cogitam sim inserir novos protocolos de saúde que colaborador tem que tomar. Isso também servirá para o fornecedor. Quem quiser atender estas empresas terá pré-requisitos. Mas ainda vamos tratar disso mais a frente. Como associação, o nosso primeiro passo foi – junto com as demais entidades – correr atrás das Medidas Provisórias para que o próprio setor pudesse sobreviver. Agora vem a segunda etapa que é a renovação e reinvenção do nosso negócio. Teremos mudanças e de fato e primeiro serão estes protocolos.
M&E – Já há um protocolo padrão a ser adotado pelas agências Abracorp?
Carlos Prado – Estamos trabalhando, como referência, o material elaborado pela Fiesp para o retorno das atividades econômicas. Isso independentemente de regras que o governo deve anunciar.Certamente empresas vão exigir isso dos seus fornecedores também, incentivando muito o uso de máscara sempre que sair para a rua, não só no transporte coletivo. Muitos dos nossos associados estão adquirindo máscaras. São cerca de quatro por dia para cada colaborador. Isso é algo que estamos insistindo e pedindo para que seja feito desta forma. O comportamento do viajante também irá mudar.
M&E – Há uma crença no mercado de que o corporativo pode retornar mais rápido. Qual é a sua expectativa sobre uma retomada?
Carlos Prado – Sempre com base em estudos de consultorias, que fizeram ótimos trabalhos, e também comparando com a história de outras pandemias e até mesmo de outros países como a China temos uma previsão. Caso o Governo de São Paulo flexibilize, mesmo que um pouco, as regras e com todos os cuidados com a saúde – começamos a ter algum movimento no começo de junho. Depois disso, gradativamente voltamos a crescer, mas lembro que há um receio – que é inerente ao ser humano – em se deslocar. Isso é natural. Mas quando estiver bem claro que o uso da máscara é o novo normal, aos poucos as pessoas retomarão a vida. Primeiro o cuidado com a saúde, depois a retomada da confiança. Não há como pular estas etapas. Com um avanço gradativo, esperamos que no último trimestre a gente tenha 50% que tínhamos de movimentação no mesmo período do ano passado. Isso no doméstico, que deve voltar aos níveis atuais só em 2021. O internacional está mais distante e voltará aos mesmos níveis só em 2022. Temos aí o estrago financeiro que fará com que muitas empresas saiam menores da crise.
Quando estiver bem claro que o uso da máscara é o novo normal, aos poucos as pessoas retomarão a vida. Primeiro o cuidado com a saúde, depois a retomada da confiança.
M&E – As respostas do governo com as MPs e linhas de crédito foram adequadas e atendem o setor?
Carlos Prado – Foi razoável. Temos boas conquistas, claro. Mas se a pergunta é se atendeu 100%, muitas empresas dirão que atendeu, mas para muitos não foi tão relevante. Estamos esperando uma linha de crédito. O projeto já passou pelo Senado e vamos aguardar os próximos passos para isso. As demais respostas foram de razoáveis para bom, mas depende da empresa. No geral tivemos conquistas.
M&E – A oferta de crédito é hoje o principal gargalo para as empresas do Turismo, especialmente as agências?
Carlos Prado – De fato está ocorrendo que as linhas já anunciadas não estão chegando até nós. Há alguns fatores para isso, quando o problema envolve pendências das empresas ou se balanços anteriores mostraram prejuízos, não irá mesmo sair. A Medida Provisória do crédito nos ajuda no sentido das garantias, pois permitirá que isso seja feito por fundos, que é um pouco mais complexo. Este é o nosso grande desafio agora.
M&E – Isso reforça a importância da governança, que a Abracorp vem dizendo há tempos?
Carlos Prado – Com uma boa governança, as empresas deixam de ser frágeis e isso facilita o crédito. Como isso é trabalhado pela Abracorp, as nossas associadas acabam saindo na frente neste sentido. A grande maioria fará a travessia, chegará com feridas, mas sairá do outro lado viva.