Deputado federal constituinte e ex-deputado estadual, Domingos Leonelli é o atual secretário de Turismo da Bahia, função que exerceu durante quase todo o primeiro mandato do governador Jaques Wagner e retomada neste início da segunda gestão, acumulando as presidências da Empresa de Turismo da Bahia (Bahiatursa) e do Fórum Nacional de Secretários e Dirigentes do Turismo (Fornatur). À frente deste último a um ano e meio, Leonelli teve seu mandato prorrogado por mais seis meses, período que termina logo após as eleições municipais, quando uma nova diretoria será escolhida para o Fórum.
Com a clareza daqueles que entendem do setor e opiniões enfáticas, Leonelli faz uma avaliação do turismo brasileiro e aponta os principais problemas enfrentados pelos estados, colocando São Paulo como um caso a parte. “Os outros estados do Brasil sofrem, em grau menor ou maior, da questão da sazonalidade. Esse é o problema mais comum em todos eles e se apresenta das formas mais variadas. As soluções são bem diferenciadas, mas a baixa estação é um problema estrutural do turismo”, lamenta.
As ligações aéreas também são outro fator que, de acordo com ele, merecem ser revistas pelo governo. “Se de um lado precisamos de maior abertura, inclusive para maior participação de capital estrangeiro nas empresas, por outro precisamos de maior regulamentação. A Tam, por exemplo, não pode ser a dona absoluta de todas as linhas aéreas no Brasil”, alerta.
Confira estas e outras declarações de Domingos Leonelli, na entrevista abaixo:
M&E – Qual o maior problema enfrentado pelos estados brasileiros no que diz respeito ao turismo atualmente?
Domingos Leonelli – Os problemas enfrentados são de naturezas diversas. São Paulo é um caso a parte, único destino auto-sustentável do Brasil, sem baixa estação, sustentado basicamente pelo turismo de negócios e que mantém um esforço para ampliar o turismo cultural e o turismo interno. Os outros estados do Brasil sofrem, em grau menor ou maior, da questão da sazonalidade. Esse é o problema mais comum em todos eles e se apresenta das formas mais variadas. As soluções são bem diferenciadas, mas a baixa estação é um problema estrutural do turismo. É a maior dificuldade que os destinos enfrentam. Como manter um equipamento durante baixa estação? Não queremos que nenhum destino brasileiro seja um balneário. Não queremos que nenhum destino do Brasil passe pelo mesmo que Valparaíso (Chile), por exemplo, onde os restaurantes fecham na baixa temporada.
M&E – E como resolver isso?
Domingos Leonelli – É uma luta incessante contra a baixa estação. Isso se resolve com turismo de negócios e convenções, eventos promocionais que são feitos na baixa estação e calendarização desses eventos. Por exemplo, na Bahia, calendarizamos o Stock Car, nos próximos cinco anos, no mês de agosto, as pessoas sabem que teremos esse evento. Isso facilita a venda dos destinos pelos agentes e operadores.
M&E – As fusões no setor do turismo tem se tornado uma tendência. Grandes operadoras se unem, assim como companhias aéreas. Esse tipo de movimento traz benefícios ou desvantagens?
Domingos Leonelli – No caso das companhias aéreas, se a fusão for acompanhada de uma maior abertura internacional, ela será benéfica, porque poderá criar condições de melhor atendimento, maior oferta de produtos, diversificação e distribuição da malha aérea, evitando uma concentração excessiva como ocorre em São Paulo. O setor aéreo está precisando de uma abertura maior no mercado internacional, porém de maior regulação no mercado nacional. Acho errado o le ce faire que vem prevalecendo. A presença do Estado tem que se fazer sentir para normatizar e distribuir melhor as linhas aéreas internacionais. Não é justo que São Paulo e Rio de Janeiro concentrem mais de 80% dos voos internacionais. Ou seja, se de um lado precisamos de maior abertura, inclusive para maior participação de capital estrangeiro nas empresas, por outro precisamos de maior regulamentação. A Tam, por exemplo, não pode ser a dona absoluta de todas as linhas aéreas no Brasil.
M&E- O que achou do Congresso da Abav se tornar itinerante, de forma separada da feira? O senhor defende a idéia de que tanto a Feira quando o Congresso podem ser realizados em outras regiões do país, além do Sudeste?
Domingos Leonelli – O problema da Abav não é o local no qual ela é realizada, mas sim as características da feira. Não adianta apenas mudar de local. Isso é positivo, mas se ela não mudar sua natureza, não será boa para os estados. Pode até ser uma boa feira para venda dos destinos estrangeiros, mas os estados brasileiros estão reduzindo sua participação e reduzirão ainda mais se a feira mantiver esse caráter de turismo exportativo. O ideal seria uma feira brasileira, uma feira para vender o Brasil aos estrangeiros. Uma feira do Brasil para o exterior, e não do exterior para o Brasil.
M&E – Durante reunião do Fornatur, o secretário executivo do MTur, Valdir Simão, ressaltou a necessidade de maior aproximação com as secretarias. Como o senhor classifica a relação do Fornatur com o Ministério do Turismo?
Domingos Leonelli – Há, sem dúvida, maior disposição para o diálogo; maior disposição para tornar esse diálogo efetivo, mas ainda há um certo caminho a percorrer entre a efetividade e a boa vontade.
M&E – O senhor acredita que o Pronatec Copa será capaz de qualificar os principais envolvidos na cadeia do turismo até 2014? Como essa verba será repassada para os Estados?
Domingos Leonelli – Não temos condições ainda de avaliar isso. É elogiável o esforço que o ministro vem fazendo para colocar “ordem na casa”. O Pronatec é algo positivo, mas ainda é cedo para fazer uma avaliação. Penso que devemos pensar mais em qualidade do que quantidade. É melhor capacitar bem nossos profissionais, mesmo que seja num número menor. Os detalhes que tangem ao Pronatec estão avançando, mas de uma forma geral, essa questão da qualificação profissional precisa ser melhor trabalhada entre os estados e o MTur.
M&E – Os Estados já chegaram a um acordo com o MTur no que tange às verbas descentralizadas? Elas serão repassadas ainda em 2012 ou isso vai acabar ficando para o próximo ano?
Domingos Leonelli – As verbas descentralizadas atrasaram muito por conta do MTur. Neste ano, o período eleitoral dificultou ainda mais sua efetivação. A verba é importante principalmente para os pequenos estados, quem têm menor capacidade de investimento e que possuem necessidades mais básicas em relação ao turismo.
M&E – Qual a posição do Fornatur sobre a implantação do Sistema Brasileiro de Classificação de Meios de Hospedagem (SBClass)?
Domingos Leonelli – O grande erro foi não colocar a classificação hoteleira como algo obrigatório. Esse é o principal problema do projeto. Além disso, ele está se arrastando há quase quatros anos, o que é muito ruim. Esse setor é um setor que anda devagar, muito mal a meu ver.
M&E – O senhor propôs, durante uma das reuniões do Fornatur, uma pauta de trabalho que extrapole os limites das cidades-sede da Copa de 2014. Uma parceria em três frentes: promoção, qualificação e linhas de financiamento. Seria esse o tripé de preparação do país para receber bem não só os grandes eventos, mas os turistas que aqui chegarão após 2014 e 2016?
Domingos Leonelli – Tenho muito medo dessa aposta total na Copa de 2014. Não acho muito positivo jogar todas as fichas nesse evento porque isso pode gerar uma grande desilusão. Porém, acho que devemos fazer associações de destinos e roteiros integrados. A Bahia deve se juntar com Sergipe e Alagoas; o Espírito Santo com Rio de Janeiro; Maranhão com Ceará; Pará com Amazonas. O investimento em qualificação é o mais importante porque é o m
ais perene. O maior legado da Copa será a qualificação profissional e formação do capital humano.
M&E- Qual o balanço que o senhor faz desse tempo em que está à frente do Fornatur?
Domingos Leonelli – A presidência do Fornatur me deu a oportunidade e a obrigação de pensar mais no Brasil, no interesse de todos os estados e não apenas nos interesses da Bahia. Eu sou um patriota baiano muito acirrado, e a presidência me obrigou a ver mais, observar mais e compartilhar os interesses dos estados como um todo. Principalmente daqueles estados que têm políticas de turismo recentemente implantadas.