Em dez anos, o segmento de cruzeiros marítimos no Brasil teve um crescimento médio de 20% ao ano – enquanto os demais mercados apresentaram um resultado de apenas 7%. Para dar conta de tantas situações que envolvem um grande setor em expansão e ajudar o então novo segmento a se desenvolver, foi criada em 2006 a Abremar (Associação Brasileira de Cruzeiros Marítimos). No início, Eduardo Nascimento esteve à frente da associação. Em 2009, em um mandato tampão, Ricardo Amaral assumiu a presidência. Após três anos, em março de 2012, ele foi reeleito para mais dois anos de mandato. Segundo Amaral, o bom desempenho de sua gestão e as conquistas do segmento foram alguns dos principais motivos para a sua permanência. Em entrevista concedida ao MERCADO & EVENTOS, Amaral fez um balanço de sua gestão, falou dos avanços dos cruzeiros no Brasil e da atual temporada. Ele ainda comentou sobre as dificuldades do segmento devido às burocracias governamentais e dos altos custos de operação, mas falou com felicidade do potencial dos cruzeiros no país. Além disso, revelou porque aceitou novamente o desafio de estar à frente da Abremar e que só aceitou o convite mediante uma alteração no estatuto da entidade, que a partir de agora não permite novas reeleições.
M&E – Faça um balanço de sua gestão nesses últimos três anos e fale também de sua reeleição para o biênio 2012-2014 e suas principais metas dentro da associação. E quanto a mudança do estatuto da Abremar?
Ricardo Amaral – O Eduardo Nascimento fez um ótimo trabalho à frente da associação e eu acabei assumindo a presidência em um mandato tampão (2009-2010). Nesse meio tempo estruturamos a Abremar. Montamos uma estrutura com sede independente e contratamos uma equipe dedicada. Nesses últimos três anos, tivemos grandes vitórias. Apresentamos um relatório onde mapeamos toda a estrutura de cruzeiros no Brasil para podermos ter uma base de discussão com o governo e de certa forma orientar os investimentos. Fizemos também grandes avanços na saúde pública, com a criação de um manual em conjunto com a Anvisa para adaptar as regras já existentes do segmento lá de fora para o mercado brasileiro. Outra conquista foi a lei que regulamenta as remessas para pagamento de serviços turísticos no exterior onde os cruzeiros estão incluídos. Este foi um trabalho em parceria com a Abav e a Braztoa; e fizemos também o protocolo de intenções com o Fohb. Essas foram algumas vitórias, mas tivemos muitas outras. E quando surgiu o momento da eleição, o conselho da Abremar que é formado pelas companhias mantenedoras achou que o trabalho vinha sendo bem feito e mostrou interesse que ele continuasse comigo como presidente. Eu concordei porque acho que temos ainda muito que fazer. Mas só aceitei esse novo desafio mediante alteração no estatuto. A partir de agora haverá um rodízio a cada mandato. A cada nova eleição uma pessoa de uma determinada companhia mantenedora assumirá a presidência. A ideia é que essa companhia só volte a exercer o cargo após todas terem tido essa oportunidade. Se a associação tem interesses comuns, não importa quem é o presidente e sim o interesse no desenvolvimento do segmento.
M&E – Recentemente você disse que o Brasil está mais próximo de alcançar o 4° lugar no ranking mundial do mercado de cruzeiros marítimos e que o país tem potencial, mas esbarra na burocracia. O que falta para atingirmos essa meta?
Ricardo Amaral – O crescimento do Brasil depende de outros mercados. Enquanto o Brasil cresce, os outros destinos crescem também. E enquanto os nossos dados são sazonais, de outros destinos são anuais. Os maiores mercados são Estados Unidos (10 milhões de clientes), Inglaterra (1,5 milhão), Alemanha (1,2 milhão), Itália (889 mil), e Brasil (792 mil). As possibilidades do Brasil são enormes, mas as burocracias também. Muito se fala de problemas na infra aeroportuária. Mas não é só isso, eu acredito que o país tenha problema de infraestrutura de modo geral, seja em portos, aeroportos, estradas, etc. Essa é nossa realidade. Os investimentos necessários no segmento serão feitos por uma questão econômica, mas não acredito que isso fará com que o país fique mais competitivo. Só fará com que Brasil tenha uma condição mínima operacional. Os locais onde os investimentos estão sendo feitos são destinos já consolidados e não há nenhum novo destino sendo desenvolvido. Temos também as questões tributárias brasileiras. Hoje é mais caro você fazer um roteiro para o Nordeste do que para Buenos Aires. E esse tipo de problema não é só dos cruzeiros, é um problema de gestão governamental, onde tudo é muito difícil e complexo, gerando custos elevados.
M&E – Com esse cenário, você acredita que o cruzeiro ainda é um produto interessante para o brasileiro?
Ricardo Amaral – Os navios saem lotados durante toda a temporada. Os cruzeiros são uma excelente opção para o turista. São muito competitivos. Os preços são bons, são acessíveis pois podem ser pagos em até dez vezes e os navios tem padrão internacional. O mesmo navio que faz cruzeiro na Europa e Caribe vem para a costa brasileira. São navios modernos, revitalizados, a gastronomia é internacional. A qualidade não muda ao chegarem no país, ao contrário, melhora porque itens como feijoada e guaraná são incluídos no cardápio para agradar ao público brasileiro.
M&E – Qual a avaliação da temporada atual? E as expectativas para a próxima?
Ricardo Amaral – O resultado será de acordo com a oferta que temos. Os navios ainda estão operando e alguns deles têm lugares para venda. Ainda não temos dados consolidados, mas vejo a temporada de forma bem positiva. Apesar da oscilação de câmbio, foi uma temporada muito boa, até melhor que o planejado. Para a próxima temporada ainda é muito cedo fazer uma avaliação, cada companhia tem a sua estratégia e elas ainda estão anunciando suas ofertas. Por exemplo, uma delas já anunciou que vem com mais navio enquanto outra com menos um. Seria muito preliminar falar disso no momento. Mas não vejo mudanças drásticas.
M&E – Os recentes incidentes com alguns navios na Europa podem ter algum impacto negativo na temporada 2012-2013? E quanto aos problemas sanitários a bordo dos navios na costa brasileira? Como os brasileiros reagiram a esses episódios?
Ricardo Amaral – Os acidentes na Europa sem dúvida impactam de forma negativa o segmento, mas quem já viajou de navio sabe o quanto eles são seguros. Acidentes de navio impactam da mesma forma que um acidente de avião ou de carro. A pessoa fica preocupada, mas continua viajando. Seja por necessidade ou não. No decorrer do tempo essa preocupação diminui e se dissipa. Num primeiro momento houve um impacto no volume de reservas, mas já houve recuperação em relação ao mesmo período do ano anterior. Cruzeiro marítimo é uma coisa boa para o hóspede e para a economia, pois gera emprego e é isso que precisa ser divulgado. Além disso, o Relatório de Inspeções em Cruzeiros Marítimos garante que todos os navios de cruzeiros das associadas Abremar possuem plenas condições de salubridade e segurança e por esse motivo, viajar em quaisquer deles não representa risco à saúde pública.
M&E – Em 2009, o MTur criou o Grupo de Turismo Náutico e disse que este setor teria prioridade. Como anda a relação da Abremar com o MTur? E como andam as negociações do governo com as armadoras para termos navios durante a Copa?
Ricardo Amaral – O GT Náutico existe e as pessoas que o conduzem têm muito interesse no segmento. Temos o apoio do Ministério do Turismo, mas a minha percepção é talvez o governo não dê muita sustentação ao MTur. Não acredito que o problema seja o ministro ou o ministério e sim as prioridades do governo: saúde, educação, e justiça. O plano estratégico do governo é Copa do Mundo e Olimpíadas? E dentro de tudo isso tem os cruzeiros, que eu acho que são uma grande oportunidade. Em relação a termos ou não navios na Copa, acho que não teremos. Há muito tempo venho falando que não haverá navios na Copa e nas Olimpíadas por falta de tempo. Se não fretar o navio agora ou se não se flexibilizarem as condições de operações, não haverá navios nesses períodos. As companhias estão muito interessadas, mas no atual cenário não é viável. Porque o custo de operação na Europa é muito mais baixo e a receita é muito mais alta. O deadline para a Copa, por exemplo, é no máximo até julho deste ano porque já estamos vendendo navios para temporada 2013-2014.
M&E – Quando será o Cruise Day deste ano e quais as novidades do evento?
Ricardo Amaral – Neste ano, toda a coordenação do Cruise Day esta a cargo de William Hirsch, um dos diretores da Abremar. O que posso adiantar é que mudaremos um pouco o formato e voltaremos a focar mais no agente de viagem. No decorrer do tempo o evento se tornou híbrido com o Fórum Abremar, que envolvia as autoridades. O que foi importante para demonstrar a importância do segmento. Agora, separando os três eventos, manteremos o Seatrade como atividade regional dos cruzeiros – que este ano acontece em Buenos Aires; o Cruise Day voltado a capacitação e divulgação; e o Fórum com foco na relação governamental. Ao fazer tudo junto, de certa forma um ou outro acabava não sendo tão desenvolvido por conta de um objetivo maior. Ainda não sei dizer quando será realizado o Cruise Day, que já tinha uma data prevista, mas fiquei sabendo há pouco que ela foi reagendado.
M&E – Junto com sua reeleição na Abremar foi anunciado também o novo presidente executivo Aurélio Maduro, no lugar de André Pousada.
Ricardo Amaral – A Abremar tem um foco muito grande nas ações governamentais. Quando o André Pousada veio, trouxe seu conhecimento do trade turístico que era necessário naquele momento, que era unir o trade com o governo. A chegada do Aurélio é uma evolução pois ele tem um background de ciências políticas e relações governamentais. O André cumpriu uma etapa muito importante, mas também tinha interesse em voltar para o mercado de trabalho. Ele pediu para sair em novembro e desde então estávamos procurando alguém para assumir o seu lugar. Ele já tem diversas propostas e em breve deve estar voltando.